DECISÃO/OFÍCIO CIRCULAR N º434/2021.
Trata-se de Consulta Extrajudicial formulada pela Juíza de Direito e Diretora do Foro da Comarca de Anápolis-GO, Drª Aline Vieira Tomás, por intermédio da qual suscita esclarecimento acerca da competência do Juízo dos Registros Públicos para deliberar sobre pedido de bloqueio de matrícula quando solicitado pelo Oficial Registrador ou pelas partes interessadas (evento 1).
Requereu, por último, que o feito seja enviado para a Comissão de Legislação e Controle dos Atos Normativos da Corregedoria-Geral da Justiça para modificação da norma contida no artigo 10, inciso IV, do Código de Normas e Procedimentos do Foro Extrajudicial, a fim de que o texto passe a vigorar da seguinte forma: “Artigo 10. Compete ao Juízo de Registros Públicos: IV – as
dúvidas dos oficiais de registro e dos tabeliães quanto aos atos de seu ofício, e as suscitadas em cumprimento de sentenças proferidas em outros juízos, que importarem na efetivação de registros, inclusive decidindo a respeito da necessidade de bloqueio de matrícula”.
Instada, a Assessoria Correicional conclui-se que a análise de pedido de bloqueio de matrícula na esfera administrativa é competência do Juiz de Registro Público e que não deve prosperar o seu pedido de remessa dos autos à Comissão de Legislação e Controle dos Atos Normativos desta Casa, para estudo de alteração do artigo 10 do Código de Normas e Procedimentos do Foro
Extrajudicial, considerando que somente por Lei é que se poderá modificar dispositivo/matéria de ordem processual (evento 5).
No evento 7, o Assessor de Orientação e Correição salientou que caso ocorra divergência entre autoridades judiciárias e administrativas, deve-se observar o disposto no artigo 221 e seguintes do Regimento Interno desta Corte de Justiça.
Na sequência, o 2º Juiz Auxiliar desta Casa Censora, Dr. Ricardo Silveira Dourado, opinou pela adoção das seguintes medidas, no evento 8:
“a) que a magistrada solicitante seja notificada sobre a decisão a ser proferida, em especial acerca da inviabilidade de alteração, a priori, do texto do art. 10, IV, do CNPFE, nos moldes das informações constantes nestes autos, com a orientação de que eventual conflito negativo de atribuição no Processo Administrativo n. 53.2020 deverá ser colocado à análise da autoridade competente;
b) caso acolhido o presente parecer, que seja expedido Ofício Circular a todos(as) os(as) Juízes(as) de Direito das Varas de Registro Público e Diretores de Foro do Estado de Goiás, bem como aos Notários, Registradores e Associações Representativas deste Estado, informando a revogação da Decisão/Ofício Circular n. 421/2020 para dar uma interpretação extensiva as determinações nele contidas, dando amplo conhecimento da nova interpretação a ser dada no âmbito deste Órgão Censor quanto à competência para bloqueio de matrícula, nos moldes do art. 214, § 3º, da LRP, pontuando que cabe ao:
b.1) Juiz de Direito da Vara de Registro Público: ao se deparar com um caso concreto e específico, mesmo que exposto pelo próprio registrador, ou seja, decorrente de suscitação de dúvida ou de ato de ofício, analisar pedido de bloqueio de matrícula, nos moldes do art. 30, alínea “a”, itens 1 e 3, da Lei n. 9.129/81;
b.2) Juiz de Direito e Diretor do Foro: no exercício do poder de fiscalização e atos de corregedoria (Corregedor Natural e Permanente da localidade/comarca), nos termos do art. 9º, incisos I e II, do CNPFE, analisar a necessidade de bloqueio administrativo”.”
É o relatório.
Decido.
Conforme relatado, cuida-se de Consulta Extrajudicial pleiteada pela Juíza de Direito e Diretora do Foro da Comarca de Anápolis/GO, Drª Aline Vieira Tomás, através da qual suscita esclarecimento sobre a competência do Juízo dos Registros Públicos para deliberar sobre pedido de bloqueio de matrícula quando solicitado pelo Oficial Registrador ou pelas partes interessadas, e ao final, solicita o envio dos autos a Comissão de Legislação e Controle dos Atos Normativos da Corregedoria-Geral da Justiça para alteração da redação do artigo 10, inciso IV, do Código de Normas e Procedimentos do Foro Extrajudicial.
No compulso do caderno digital, extrai-se que a Diretora do Foro da Comarca de Anápolis narrou que o então Corregedor-Geral de Justiça, Desembargador Kisleu Dias Maciel Filho, proferiu no Proad nº 226636, a Decisão/Ofício Circular n. 421/2020, com a seguinte redação:
“(…) De acordo com o artigo 30, inciso V, alínea ‘a’, item 3, do Código de Organização Judiciária do Estado de Goiás (Lei n.º 9.129/1981), compete ao Juiz de Direito, na Vara de Registros Públicos, processar e julgar as dúvidas dos Oficiais de Registro e dos Tabeliães, quanto aos atos do seu ofício, e as suscitadas em cumprimento de sentença proferidas em outros juízos, que importarem na efetivação de registros, inclusive decidindo a respeito da necessidade de bloqueio de matrículas. Portanto, aludida matéria não está entre as atribuições do Diretor do Foro, tal como ressaltado na sobredita Informação n.º 103/2020 – DCSA (…)”.
Em virtude deste ato decisório, o Oficial Registrador do Registro de Imóveis da 2ª Circunscrição pugnou pela remessa do Procedimento Administrativo nº 53.2020, que tramitava na Diretoria do Foro, para a Vara de Registros Públicos, dada sua competência.
Todavia, o Juiz de Direito da Vara de Registros Públicos, declarou sua incompetência para apreciar o pedido de bloqueio de matriculas.
Diante da celeuma existente, a Diretoria do Foro pugnou pela alteração da redação do artigo 10, inciso IV, do Código de Normas e Procedimento do Foro Extrajudicial perante a Comissão de Legislação e Controle dos Atos Normativos da Corregedoria-Geral da Justiça.
Nota-se que a discussão gira em torno de se decifrar qual órgão possui competência para analisar sobre bloqueio administrativo de matrícula de imóveis, especificamente em razão de ofício do registrador ou de fiscalização, que na hipótese, a Diretoria do Foro da Comarca de Anápolis entendeu ser competência da Vara de Registro Público, que em contrapartida, reputou ser de
atribuição da Diretoria do Foro.
Esta Casa Censora teve a oportunidade de decidir sobre a matéria em alguns procedimentos administrativos. Confira-se:
Proad nº 201703000029799 (evento 12): “Ressalta, ademais, que o art. 30, inciso V, alínea “a”, item 3, do Código de Organização Judiciária do Estado de Goiás (Lei Estadual nº 9.129/1981), confere ao Juiz de Direito, na Vara de Registros Públicos, a competência para processar e julgar as dúvidas dos oficiais de registro e dos tabeliães, quanto aos atos do seu ofício, e as suscitadas em cumprimento de sentenças proferidas em outros juízos, que importarem na efetivação de registros, inclusive decidindo a respeito da necessidade de bloqueio de matrículas.” (grifo nosso).
Proad 201906000177136 (evento 29): “Busca o recorrente a reforma da aludida decisão, frente ao que preconiza o artigo 214, § 3º, da Lei nº 6.015/1973, que permite a medida excepcional do bloqueio administrativo da matrícula, em caráter preventivo, na hipótese da real possibilidade da realização de novos registros implicarem danos de difícil reparação. (…) Assim, diante da complexidade da questão posta para debate, não tem como ser analisada nesta seara administrativa. Na verdade, os artigos 214, § 3º e 216 deixaram a cargo da autoridade judiciária tomar as providências previstas no âmbito do processo judicial, quando for necessário o exame da validade dos títulos, como pode ser comprovado a partir de interpretação literal (…) Destarte, as nulidades registrais que demandam análise de provas para seu reconhecimento, só podem ser declaradas por sentença judicial, em processo contencioso.”
Proad 202005000226636 (eventos 06 e 07): “De acordo com o artigo 30, inciso V, alínea ‘a’, item 3, do Código de Organização Judiciária do Estado de Goiás (Lei n.º 9.129/1981), compete ao Juiz de Direito, na Vara de Registros Públicos, processar e julgar as dúvidas dos Oficiais de Registro e dos Tabeliães, quanto aos atos do seu ofício, e as suscitadas em cumprimento de sentenças proferidas em outros juízos, que importarem na efetivação de registros, inclusive decidindo a
respeito da necessidade de bloqueio de matrículas. (…) Ao teor do exposto, considerando o disposto no art. 2º, do Código de Normas e Procedimentos do Foro Extrajudicial, que versa sobre a competência do Juízo de Registros Públicos para processar e julgar as dúvidas dos oficiais de registro e dos tabeliães, quanto aos atos de seu ofício, e as suscitadas em cumprimento de sentenças proferidas em outros juízos, que importarem na efetivação de registros; acolho a sobredita peça opinativa e determino a revogação do Ofício Circular nº 107/2017, desta Casa
Censora. Outrossim, expeça-se ofício circular a todos os Diretores de Foro do Estado de Goiás, notários, registradores e às respectivas associações representativas, instruído com cópia desta decisão e dos eventos 4 e 5, para amplo conhecimento e devida observância.” (grifo nosso).
Frise-se que, por intermédio do Ofício Circular n° 491/2020, a decisão proferida no Proad nº 226636 foi enviada a todas as Diretorias de Foro, Notários, Registradores e Associações Representativas, para cientificar o posicionamento adotado deste Órgão Censor, à época, que na ocasião, posicionou-se pela competência, tão somente, da Vara de Registro Público para analisar e decidir sobre imbróglios relativos ao bloqueio de matrículas.
Não obstante a existência de interpretação e decisões proferidas anteriormente por esta Casa Censora, no sentido de que a competência sobre a matéria é apenas da Vara de Registro Público, o tema é divergente, motivo pelo qual passo a discorrer permenorizadamente sobre o assunto.
Urge esclarecer que o registrador imobiliário tem o papel de zelar pelo princípio da continuidade e também pela disponibilidade dos imóveis, sendo que, ao se deparar com possível irregularidade de registro, que pode ocorrer por uma diversidade de razões, tais como matrículas com correntes filiatórias oriundas de um mesmo tronco, com origem primitiva idêntica; matrículas com correntes filiatórias distintas ou conflitantes de origem diversa; matrículas de uma mesma corrente ou origem, dentre outros, compete ao registrador comunicar a autoridade competente que está subordinado, noticiando a contrariedade/duplicidade de matrículas que, como medida cautelar, poderá ser determinado o bloqueio para que, na esfera própria, seja discutida a validade de um ou de outro registro, apurando-se quem detém o melhor título.
Denota-se que o artigo 214, § 3º, da Lei nº. 6.015/1973, admite o bloqueio administrativo da matrícula em caráter preventivo em caso de existência da possibilidade de que a realização de novos registros implique em danos de difícil reparação.
Consoante redação da norma acima apontada, as nulidades de pleno direito do registro, provadas, invalidam-no e, se o magistrado entender que a superveniência de novos registros possa causar danos de difícil reparação, poderá determinar o bloqueio da matrícula do imóvel.
Destarte, para que o magistrado invalide um registro ou determine o bloqueio da matrícula do imóvel, deve a nulidade ser “de pleno direito”, ou seja, sem necessidade de se recorrer ao Poder Judiciário.
Com efeito, as nulidades registrais que demandam análise de provas para seu reconhecimento só podem ser declaradas por sentença judicial, em processo contencioso, com a participação de todos os envolvidos, sob pena de afronta ao devido processo legal e nulidade, o que, inclusive, é reforçado pelo § 1º do artigo 214 da Lei nº 6.015/73, segundo o qual “a nulidade será decretada depois de ouvidos os atingidos”.
Outrossim, o artigo 214 da Lei de Registros Públicos, acima transcrito, somente deve ser aplicado em casos de nulidades no mecanismo de registro, restando afastada sua aplicação em caso de conflito quanto ao título, ocasião em que a pretensão deverá ser deduzida na via jurisdicional.
Como bem ressaltou o 2º Juiz Auxiliar desta Casa de Fiscalização, Dr. Ricardo Silveira Dourado, ao realizar interpretação do art. 214, § 3º, da Lei nº 6.015/73: “é possível concluir que a atribuição para determinar o bloqueio da matrícula, vai depender de cada caso específico com destaque de que a ordem não necessariamente se limita na esfera de atuação judicial, isto é, para os procedimentos contenciosos, sendo pacífico que referida ordem pode surgir dentro do bojo de um procedimento administrativo ou, ainda, isoladamente dentro das funções de fiscalização do Poder Judiciário. Em resumo, o bloqueio pode ocorrer em 03 (três) hipóteses: 1) Judicialmente; 2) Decorrente de um processo administrativo; 3) Decorrente da atuação de fiscalização do Juiz Corregedor”. (grifo no original).
A título de elucidação sobre a matéria colocada sob análise, transcrevo julgados que exprimem tais orientações:
“CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. CANCELAMENTO DE REGISTRO IMOBILIÁRIO. NATUREZA ADMINISTRATIVA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. 1 – Consoante entendimento pacificado desta Corte, não existindo lide, compete ao Juízo de Direito corregedor processar e julgar o pedido de cancelamento de registros imobiliários, não importando se este foi formulado por ente federal, porquanto a questão é de natureza meramente administrativa. Precedentes. 2 – Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo da Vara de Feitos Criminais, Júri, Menores, Fazenda Pública e Registros Públicos de Bom Jesus da Lapa/BA, o suscitado.” (STJ – CC 31.046/BA, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 11/06/2003, DJ 30/06/2003 p. 126)” (grifo nosso);
“Recurso administrativo. Reclamação administrativa. I – Bloqueio de matrícula de imóvel. Fraude no registro. Inadequação da via eleita. As nulidades registrais que demandam análise de provas para seu reconhecimento só podem ser declaradas por sentença judicia l, em processo contencioso, com a participação de todos os envolvidos, sob pena de afronta ao devido processo legal e nulidade, o que, inclusive, é reforçado pelo § 1º do artigo 214, da Lei 6.015/73, segundo o qual a nulidade será decretara depois de ouvidos os atingidos. Ademais, o artigo 214 da Lei de Registros Públicos somente deve ser aplicado em casos de nulidades no mecanismo de registro, restando afastada sua aplicação em caso de conflito quanto ao título, ocasião em que a pretensão deverá ser deduzida na via jurisdicional. II Apuração da conduta do tabelião. Impropriedade. O recorrente não pleiteia, em sua peça recursal, a apuração de supostos atos irregulares praticados pelo então Titular do Cartório de Registro de Imóveis da 1ª Circunscrição de Goiânia. Outrossim, conquanto seja possível a determinação da referida apuração de ofício pelo magistrado, registre-se que o atual Titular da Serventia recorrida assumiu a referida função apenas em abril/2014, em data posterior ao registro da escritura questionada, não podendo a ele ser imputada qualquer responsabilidade praticada em data anterior a sua assunção no Cartório. Recurso administrativo conhecido e desprovido.” (TJGO, Recurso Administrativo n. 5496491-92.2020.8.09.0000, Rel. Des Norival Santomé, publicado em 17/08/2021). (grifo nosso);
“RECURSO ADMINISTRATIVO. REGISTRO DE IMÓVEIS. INDEFERIMENTO DA PRETENSÃO DE INVALIDAÇÃO E NULIDADE DO ATO REGISTRAL NA VIA ADMINISTRATIVA. HIPÓTESE QUE NÃO CONFIGURA A DENOMINADA NULIDADE DE PLENO DIREITO. NECESSIDADE DE RECONHECIMENTO NA VIA JUDICIAL E EM AÇÃO CONTENCIOSA, NOS TERMOS DOS ARTS. 214, § 1º, E 216, AMBOS DA LEI N 6.015/73. SENTENÇA CONFIRMADA. I. Sabe-se que na via administrativa só é possível o reconhecimento da chamada nulidade de pleno direito, prevista no caput do art. 214 a Lei nº 6.015/73, nas hipóteses de nulidades referente ao ato de registro, extrínsecas e formais; ao passo que as questões concernentes à existência e validade dos negócios jurídicos consubstanciado no título, ou seja, nulidades intrínsecas ao título causal, constituem hipótese nas quais há necessidade de anulação do registro via jurisdicional, de forma contenciosa. II. No caso em testilha, verifica-se que o recorrente funda sua pretensão no reconhecimento de invalidação e nulidade do registro na matrícula especificada, alegando que o registro de imóvel que supere a 30 salários-mínimos não pode ser realizado com base num contrato particular de compra e venda de imóvel, mas sim via escritura púbica, bem como a ilegitimidade do registrante, revelam-se questionamento quanto à existência de validade do título, hipótese que não configura nulidade de pleno direito, por reclamar o reconhecimento na via jurisdicional e em ação contenciosa, com citação dos participantes do ato registral que se pretende cancelar, ao teor dos arts. 214, § 1º, e 216, ambos da Lei nº 6.015/73. III. Com efeito, verifica-se que é possível sim o cancelamento administrativo do registro, mas não quando se tratar de declaração de nulidade decorrente de vício de origem do impediente da aquisição regular do domínio, situação que deverá sempre ser precedida de via judicial transitada em julgado. A nulidade aventada neste procedimento administrativo não decorre do ato do registro, mas sim do título que lhe deu causa, e, portanto, inviável sua apreciação na via escolhida pelo recorrente. IV. Desse modo, impõe a confirmação da sentença objurgada que reconheceu a inadequação da via eleita, porquanto a declaração de invalidação e de nulidade do registro reclama via judicial, e não por meio de procedimento administrativo. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.” (TJGO, RECURSO ADMINISTRATIVO 383447-25.2016.8.09.0000, Rel. DES. LUIZ EDUARDO DE SOUSA, CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA, julgado em 04/06/2018, DJe 2523 de 13/06/2018) (grifo nosso).
Conquanto, ainda que exista a possibilidade de bloqueio administrativo, na maioria das vezes, a provocação da via jurisdicional será indispensável para o desfecho da matéria, quando houver necessidade de dilação probatória, já que não poderá ser decidida nos estreitos limites de um procedimento administrativo.
À vista disso, o pedido para bloqueio de matrícula deve ser dirigido ao juízo competente, tanto na seara administrativa quanto na judicial, ou ainda, ser determinado de ofício no exercício do poder fiscalizatório do Juiz Corregedor.
No Estado de Goiás, transcrevo as atribuições elencadas concernentes a Vara de Registro Público, consoante dispõe o Código de Organização Judiciária (Lei Estadual nº 9.129/81):
“Art. 30 – Compete ao Juiz de Direito:
V – Na Vara de Registros Públicos:
a) processar e julgar:
1 – as causas que versarem sobre registros públicos;
2 – (…)
3 – as dúvidas dos oficiais de registro e dos tabeliães, quanto aos atos do seu
ofício, e as suscitadas em cumprimento de sentenças proferidas em outros juízos, que
importarem na efetivação de registros”;
E à Diretoria do Foro não há competência expressa neste sentido, conforme o artifo 31 do Código de Organização Judiciária (Lei Estadual nº 9.129/81).
Por outro lado, nos moldes do artigo 9º do Código de Normas e Procedimentos do Foro Extrajudicial desta Casa Censora:
“Art. 9º. Compete ao Juiz de Direito ou Substituto, no exercício da Diretoria do Foro:
I – exercer a fiscalização permanente dos serviços extrajudiciais e aplicar penas disciplinares aos seus titulares pelas faltas ou abusos que cometerem;
II – realizar correição ordinária periódica, extraordinária e visita correicional em todas as serventias extrajudiciais da comarca e seus distritos judiciários, sujeitos à sua fiscalização”;
Neste caso, chega-se a conclusão através das normas acima citadas, concernente ao Estado de Goiás, de que, ao se deparar com um caso concreto e específico, mesmo que exposto pelo próprio registrador, ou seja, decorrente de suscitação de dúvida ou de ato de ofício, que a competência
para determinar o bloqueio de matrícula será da Vara de Registros Públicos, nos termos do que preceitua o artigo 30, alínea “a”, itens 1 e 3, da Lei nº. 9.129/81.
Porém, se em decorrência do poder de fiscalização e atos de corregedoria (Corregedor Natural e Permanente), nos moldes do artigo 9º, incisos I e II, do Código de Normas e Procedimentos do Foro Extrajudicial, competente será a Diretoria do Foro para deliberar o bloqueio administrativo.
Assim, o desfecho da solução posta é de que ambas as autoridades, tanto da Vara de Registro Público como da Diretoria do Foro, possuem atribuição para determinar o bloqueio de matrícula de imóveis, nos moldes do artigo 214, § 3º, da LRP, devendo a questão ser analisada individualmente, a depender de cada caso.
Na espécie trazida a esta Corregedoria pela Diretoria do Foro da Comarca de Anápolis (Procedimento Administrativo nº. 53.2020), detem-se que as duas autoridades possuem atribuição para dirimir a questão, seja porque o caso é ato de ofício do registrador, seja porque também é decorrente de poder de fiscalização, resolvendo-se a situação com supedâneo no artigo 59 do Código de Processo Civil.
Entretanto, considerando que houve conflito negativo de atribuição, ou seja, ambas as autoridades proferiram decisão declinando o julgamento, necessária a suscitação de tal conflito, salientando que a interpretação dada sobre a questão, por este Órgão Censor, não retira a atuação da autoridade competente para julgar o conflito instaurado.
Por isso, com relação ao conflito negativo de atribuição ocorrido no Processo Administrativo n. 53.2020, convem pontuar, que a divergência entre autoridades judiciárias e administrativas reclama a observância de procedimento próprio, não sendo esta Corregedoria órgão competente para deliberação, nos termos explícitos pela Constituição Federal, Constituição Estadual, Código de Organização Judiciária e Regimento Interno do TJGO. Veja:
O artigo 125 da Constituição Federal preceitua: “Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição. § 1º A competência dos tribunais será definida na Constituição do Estado, sendo a lei de organização judiciária de iniciativa do Tribunal de Justiça.”
Por sua vez, o artigo 46 da Constituição estadual dispõe: “Compete privativamente ao Tribunal de Justiça: (…) m) os conflitos de competência entre juízes;”
E o artigo 221 do Regimento Interno desta Corte de Justiça preconiza: “O conflito de jurisdição poderá ocorrer entre autoridades judiciárias; e o de atribuições, entre estas e as administrativas. Parágrafo único. Dar-se-á o conflito nos casos previstos em lei”.
Destarte, ocorrendo conflito negativo no caso concreto, compete à autoridade a suscitação do conflito junto ao órgão competente para deliberação, que, nos moldes do artigo 46 da Constituição Estadual de Goiás, é o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás.
Noutra vertente, com referência à proposta para alteração da normativa do artigo 10, inciso IV, do Código de Normas e Procedimentos do Foro Extrajudicial, insta salientar que o texto apenas replicou o dispositivo do artigo 30, inciso V, alínea “a”, item “3”, do Código de Organização Judiciária do Estado de Goiás (Lei Estadual n. 9.129/81).
Desse modo, neste momento, entendo que não existe necessidade de modificação do texto normativo do Código de Normas e Procedimentos do Foro Extrajudicial, nos moldes postulados pela Magistrada solicitante, ressalvada a possibilidade de revisão desse entendimento em
oportunidade posterior.
Diante de tais considerações, acolho o parecer precitado e determino as seguintes providências:
a) Notifique-se a magistrada solicitante acerca da inviabilidade da modificação da norma contida no artigo 10, inciso IV do Código de Normas e Procedimentos do Foro Extrajudicial, nos termos das informações constantes nestes autos, com a orientação de que eventual conflito negativo de atribuição no Processo Administrativo nº. 53.2020 deverá ser analisado pela autoridade competente;
b) Expeça-se Ofício Circular a todos(as) os(as) Juízes(as) de Direito das Varas de Registro Público e Diretores de Foro do Estado de Goiás, bem como aos Notários, Registradores e Associações
Representativas deste Estado, informando a revogação da Decisão/Ofício Circular nº. 421/2020 para dar conhecimento da nova interpretação adotada por este Órgão Censor quanto à competência para bloqueio de matrícula, nos moldes do artigo 214, § 3º, da Lei nº 6.015/73, pontuando que cabe ao:
b.1) Juiz de Direito da Vara de Registro Público: ao se deparar com um caso concreto e específico, mesmo que exposto pelo próprio registrador, ou seja, decorrente de suscitação de dúvida ou de ato de ofício, analisar pedido de bloqueio de matrícula, nos moldes do artigo 30, alínea “a”, itens 1 e 3, da Lei Estadual nº. 9.129/81;
b.2) Juiz de Direito e Diretor do Foro: no exercício do poder de fiscalização e atos de corregedoria (Corregedor Natural e Permanente da localidade/comarca), nos termos do artigo 9º, incisos I e II, do Código de Normas e Procedimentos do Foro Extrajudicial, analisar a necessidade de bloqueio administrativo.
Cientifique-se a Juíza de Direito e Diretora do Foro da Comarca de Anápolis-GO, Drª Aline Vieira Tomás, encaminhando-se cópia desta decisão.
Após, determino o arquivamento dos autos, procedendo-se às anotações na divisão competente.
A reprodução deste ato serve como ofício.
À Secretaria-Executiva.
GABINETE DA CORREGEDORIA-GERAL DA JUSTIÇA, em Goiânia, datado e assinado digitalmente.
Desembargador Nicomedes Borges
Corregedor-Geral da Justiça